A IC é uma doença frequente e uma das principais causas de hospitalizações no mundo. A despeito da gravidade e elevada mortalidade, seu tratamento encontra-se abaixo do considerado adequado e bastante associado à baixa aderência dos pacientes, como demonstrado pelo Registro Brasileiro de Insuficiência Cardíaca Aguda (“Brazilian Registry of AcuTe Heart FailurE” - BREATHE).
A causa mais comum de IC no mundo é a doença isquêmica, associada à necrose miocárdica, causando perda de tecido contrátil e disfunção ventricular sistólica esquerda. O registro BREATHE, estudo recente de iniciativa do Departamento de Insuficiência Cardíaca da Sociedade Brasileira de Cardiologia, permitiu a avaliação detalhada de características de pacientes que internam com diagnóstico primário de IC agudamente descompensada em hospitais de todas as regiões brasileiras. A cardiopatia isquêmica, a miocardiopatia dilatada idiopática e a cardiopatia hipertensiva foram as principais etiologias encontradas, representando aproximadamente 65% dos casos.
Embora não existam estudos documentando de forma precisa a prevalência de IC no Brasil, estima-se que cerca de 2-4 milhões de brasileiros sejam acometidos pela síndrome. As internações por IC em hospitais públicos brasileiros representam aproximadamente 2% de todas as admissões, e, em 2013, foram mais de 230 mil hospitalizações. Na população adulta idosa, a IC já representa a principal causa de hospitalização no Brasil.
Apesar da importante melhoria na sobrevida dos pacientes em paralelo à introdução de terapias modernas baseadas em evidências e estratégias multifacetadas de tratamento, dados mundiais indicam que entre 17 e 45% dos pacientes admitidos ao hospital por IC irão morrer dentro de um ano, e a maioria não estará viva após 5 anos.
As razões para a implementação sub-ótima dos tratamentos incluem barreiras complexas e múltiplas nos níveis do sistema de saúde, médico e pacientes. O conceito de autocuidado está associado à autonomia, independência e responsabilidade para atividades necessárias no gerenciamento das condições de saúde. E a promoção deste autocuidado é essencial na IC por envolver atividades e habilidades a serem aprendidas e consideradas para melhorar a qualidade de vida do paciente.
Diversas abordagens têm sido testadas no autocuidado que englobam enfermeiras gestoras do caso, como lembretes para tomada de medicamentos e gestão de sintomas, educação ao paciente, abordagens de redes sociais e aplicativos, mas sem evidências consistentes na literatura. As tecnologias móveis têm sido apresentadas como abordagens inovadoras e de potencial larga escala para reduzir eventos de doenças cardiovasculares, mas as evidências relacionadas à eficácia e aceitabilidade ainda permanecem limitadas.
Estratégias para melhorar a aderência das diretrizes atuais têm demonstrado sucesso no manejo destes pacientes. Dentre elas, a promoção do autocuidado por envolver atividades e habilidades que um indivíduo deve aprender e usar para melhorar a sua qualidade de vida ao longo dos anos tais como adesão às recomendações farmacológicas, ao consumo de uma dieta saudável, cessação do tabagismo, consumo limitado de álcool, monitoração diária do peso e de sinais ou sintomas de descompensação. As tecnologias móveis têm sido apresentadas como abordagens inovadoras na autogestão da doença, mas as evidências relacionadas à eficácia e aceitabilidade ainda permanecem limitadas. A avaliação da eficácia, aceitabilidade e utilidade de aplicativos móveis para autogerenciamento da insuficiência cardíaca deve ser considerada para implementação na prática clínica.
Através da implementação de programa de novas tecnologias e autocuidado para pacientes ambulatoriais com estratégia multifacetada de cuidados, o projeto Coração Bem Cuidado busca reduzir o número de internações hospitalares por descompensações e óbitos em pacientes com insuficiência cardíaca. Espera-se que tecnologias e programa clínicos de atendimento, uma vez comprovados seus benefícios, possam ser replicados de forma eficiente para a maioria dos pacientes ambulatoriais atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Também faz parte dos objetivos desenvolver e avaliar a factibilidade de uma estratégia de monitorização, educação e autocuidado para otimizar o manejo do paciente após a alta hospitalar.
Objetivos do Plano Nacional de Saúde aos quais o projeto se vinculará:
Políticas públicas vinculadas:
Benefícios aos SUS:
Trata-se de um ensaio clínico fase II randomizado, multicêntrico, nacional, com avaliação cega de desfechos que visa avaliar a efetividade da promoção de autocuidado utilizando estratégia multifacetada para pacientes com insuficiência cardíaca.
Serão incluídos pacientes adultos (> 18 anos) com insuficiência cardíaca de qualquer causa, em seguimento ambulatorial no período vulnerável após episódio de descompensação aguda (no dia da alta ou em até um mês após alta hospitalar); com possibilidade de acesso à telefonia celular; fração de ejeção reduzida (FE<40%), avaliados por exames complementares de imagem até três meses antes da randomização.
Os pacientes serão alocados para grupo experimental ou grupo controle: os pacientes do grupo intervenção receberam uma estratégia de incentivo ao autocuidado utilizando uma estratégia multifacetada com base em uso de um dispositivo de tele monitoramento, baseado em mensagens por “short message system” (SMS), associado a algoritmos de inteligência artificial, ferramentas de ensino do autocuidado, e profissional de saúde gestor de caso. O grupo controle manterá sua estratégia de cuidados normalmente.
Desfechos primários e secundários de satisfação do paciente, adesão, qualidade de vida, avaliação de autocuidado, conhecimento e adesão ao tratamento de IC; mortalidade cardiovascular, internação hospitalar e visita ao departamento de emergência.
Grupo Intervenção
Neste grupo será realizada a promoção de autocuidado utilizando uma estratégia multifacetada baseada em mensagens por SMS, associadas a algoritmos de inteligência artificial, ferramentas de ensino do autocuidado e profissional de saúde gestor de caso (a ser acionado em situações pré-determinadas).
Os pacientes receberão diariamente mensagens para otimizar autocuidado em insuficiência cardíaca, com as seguintes funções:
As mensagens serão enviadas diariamente nas 4 primeiras semanas, 3 a 4 vezes por semana no mês 2-3 após a randomização, e semanalmente até o final do seguimento de 180 dias. Será questionado ao paciente qual a frequência de mensagens lhe é mais conveniente a partir do término do primeiro mês.
Grupo Controle
Os pacientes randomizados para o grupo controle receberão abordagem de tratamento convencional, de acordo com as rotinas assistenciais de suas instituições, recebendo as instruções e recomendações usuais realizadas nas consultas ambulatoriais de cada instituição, sem interferência relacionada ao estudo.
Com a estimativa provável de alcance dos 307 pacientes acordados no triênio 2018-2020, a projeção é a conclusão da inclusão dos 393 pacientes restantes - 197 pacientes por centro coordenador - no triênio 2021- 2023 e término do seguimento dos 700 pacientes, primariamente propostos, e responder à questão com poder estatístico adequado.
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Mariana Guimarães Blacher - Hospital Moinhos de Vento, Porto Alegre - Lattes
E-mail: mariana.blacher@hmv.org.br
Telefone: (51) 99714-4513