A parada cardiorrespiratória (PCR), conforme o nome explica, ocorre na interrupção dos batimentos cardíacos e da respiração. Acontece de forma inesperada, ameaçando gravemente a vida das pessoas, principalmente das que sofrem este evento no ambiente extra hospitalar (rua, em casa, na igreja, no clube, etc). A PCR requer sempre uma atuação imediata para melhores resultados. Segundo pesquisas científicas e instituições internacionais, como a American Heart Association, as causas mais comuns incluem doenças cardíacas, problemas respiratórios, lesões graves, além de hipotermia, afogamento, overdose de drogas, entre outros.
Estima-se que, anualmente, sejam registrados em torno de 220 mil casos de PCR, com 180 mil em ambiente pré-hospitalar e metade testemunhadas por um espectador leigo, segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia. Considerando que ocorrem mais de 500 casos por ano em apenas uma capital brasileira, e que apenas em torno de 17% dos pacientes sobrevivem à PCR, há urgência em melhorar esses indicadores.
A PCR extra-hospitalar geralmente é identificada por meio dos sistemas de emergência médica, que orientam um atendimento focado em cinco pontos principais: reconhecimento imediato da PCR e ativação do sistema de emergência, como o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU); suporte básico de vida (SBV) imediato e de alta qualidade; desfibrilação precoce; suporte avançado de vida; e cuidados pós-parada cardiorrespiratória. O SBV é considerado pela American Heart Association como um método efetivo, simples e o preferido a ser ensinado para a população geral, visto que as chances de sobrevivência do paciente aumentam quando a compressão torácica e a desfibrilação são aplicados antes da chegada da equipe avançada.
Apesar de ser um dos pilares do tratamento bem-sucedido de PCR no atendimento pré-hospitalar, o suporte básico de vida ainda é pouco conhecido e realizado pela população leiga brasileira, sendo que menos de 10% se sente apto a auxiliar em uma emergência. Programas destinados a disseminar o SBV e o uso de desfibrilador externo automático (DEA) por leigos foram estabelecidos em diferentes países e contribuíram para melhorar as taxas de sobrevivência, especialmente através do uso de tecnologias para recrutar voluntários para o primeiro atendimento, como uso de mensagens de texto ou por outros aplicativos.
Sabe-se que quase 60% dos voluntários treinados atendem ao chamado em caso de PCR pré-hospitalar, sendo que 30% iniciam o SBV antes da chegada da equipe de saúde. Assim, o treinamento da população em SBV é altamente recomendado nas principais diretrizes de ressuscitação cardiovascular. No entanto, o comportamento de um programa semelhante no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS) ainda é desconhecido, uma vez que não existe divulgação de nenhum tipo de iniciativa igual a esta no sistema de saúde brasileiro.
Com base neste contexto, o projeto Cidade Cardio-Protegida trará uma mudança cultural em relação ao atendimento de PCR, beneficiando a sociedade como um todo. A entrega de um programa piloto de capacitação de socorristas em SBV ao Ministério da Saúde permitirá escalonar esta estratégia para várias cidades do país. Um melhor manejo no atendimento de PCR extra-hospitalar poderá impactar em menor tempo de internação dos sobreviventes, redução de morbidades e, consequentemente, redução de custos para o SUS a longo prazo, hipóteses que serão testadas. O objetivo geral é aprimorar o atendimento da parada cardiorrespiratória no atendimento extra-hospitalar através da inclusão de socorristas voluntários e uso de DEAs públicos.
Para isso, o projeto irá: Capacitar socorristas voluntários para SBV em Porto Alegre (RS); Cadastrar na rede SAMU voluntários da população de Porto Alegre (RS) aptos a realizar SBV (treinados pelo projeto ou previamente treinados seja por instituições credenciadas ou pelo SAMU); Mapear DEAs disponíveis (públicos e privados) em Porto Alegre; Ampliar a disponibilização de DEAs, em Porto Alegre; Avaliar a efetividade da tecnologia de localização de voluntários próximo a PCR;
Objetivos do Plano Nacional de Saúde aos quais o projeto se vincula: Objetivo 2 - Promover a ampliação da oferta de serviços de atenção especializada com vista à qualificação do acesso e redução das desigualdades regionais; Objetivo 4 - Fomentar a produção do conhecimento científico, promovendo o acesso da população às tecnologias em saúde de forma equitativa, igualitária, progressiva e sustentável.
Avaliar 230 tecnologias em saúde para incorporação no Sistema Único de Saúde.
Política Pública Vinculada: Programa Pesquisa para o SUS (PPSUS)
Capacitação de socorristas e ampliação de DEAs: Serão treinados e cadastrados voluntários aptos a realizar SBV na cidade de Porto Alegre (RS). A escolha pelo município se dá por estar entre as cinco capitais com maior número de óbitos em via pública de origem cardiovascular, sendo a terceira com maior mortalidade de origem cardiovascular, perdendo apenas para Rio de Janeiro e São Paulo. A localização dos voluntários no território, preferencialmente, deverá ser proporcional à distribuição da frequência de PCR neste.
Além do SBV hands only (técnica de SBV de somente compressões torácicas contínuas), DEAs públicos são considerados essenciais para aumentar a sobrevida em casos de PCR extra-hospitalar. Atualmente, existem poucos DEAs de acesso público e de conhecimento público em Porto Alegre.
O mapeamento de DEAs se dará através de busca ativa em locais públicos e privados, como estádios, ginásios esportivos, centros comerciais e quaisquer outros estabelecimentos com previsão de concentração ou de intensa circulação. Após esse levantamento, a estratégia de distribuição de 145 DEAs públicos adquiridos pelo projeto visa distribuí-los em redes de farmácias com ampla representatividade na cidade, tentando garantir um raio de 500m entre os estabelecimentos parceiros.
Já o treinamento em SBV será dividido em dois momentos: um teórico, abrangendo sinais de reconhecimento de PCR; teoria da realização de compressões torácicas; uso do DEA; entre outros conteúdos teóricos, e um treinamento prático de simulação de SBV em modelos anatômicos e utilização do DEA de treinamento. Visando garantir a qualidade desses processos e assegurar a equivalência do treinamento entre os voluntários, e a retenção de conhecimento, será realizado um teste pré e pós treinamento. Indivíduos com treinamento prévio em SBV poderão participar como voluntários em Porto Alegre, cadastrando-se online, sendo necessário o envio da comprovação do curso.
Serão incluídos como voluntários indivíduos de ambos os sexos, acima de 18 anos, que tenham interesse em participar do estudo e que assinem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Serão excluídos indivíduos que não assinem TCLE, analfabetos, com incapacidade física para a realização do SBV ou que não tenham um aparelho celular compatível com um aplicativo de localização através de GPS. Todos os indivíduos treinados terão acesso a materiais que auxiliam no reconhecimento da PCR e incentivam a sua realização, tendo em vista que as maiores razões para não realizar o SBV são dificuldade de identificação da PCR, medo de causar mal e capacidade emocional.
Viabilidade da tecnologia de geolocalização para recrutamento de socorristas no manejo dos casos de PCR:
Visando reduzir o tempo sem nenhuma intervenção, será utilizado um aplicativo de celular para localizar e recrutar voluntários treinados em SBV nas proximidades dos casos suspeitos de PCR. Este aplicativo foi desenvolvido pelo SAMU de Porto Alegre em parceria com a empresa terceirizada que presta o serviço de software de regulação, e está em funcionamento de forma experimental há um ano.
Este recrutamento se dará através da localização imediata (GPS) de voluntários próximos ao local da PCR (socorristas). O APP será disponibilizado para iOS e Android e integrado ao sistema de regulação do SAMU, sendo que os voluntários serão localizados através de geolocalização por meio do próprio celular, usando a tecnologia de localização de usuário do aplicativo.
Inicialmente, a sinalização da PCR deverá ser enviada pelo APP para até cinco todos voluntários treinados localizados aos arredores do evento (distância linear de 240m da vítima até, no máximo, 2.400m), buscando encontrar voluntários para irem diretamente ao local para realizar SBV. Dentro desse raio, voluntários treinados das farmácias parceiras também serão acionados e dessa forma podem se deslocar até o local do atendimento levando o DEA. A sinalização enviada via APP será uma notificação do tipo “alertas críticos” com uma mensagem de push, que ativará o aplicativo para produzir um som de alarme, apresentando um texto: “Possível PCR próxima a sua localização, você pode atender?”. O voluntário poderá optar em responder, ‘sim’ ou ‘não’”.
Se responder "sim", um mapa com o endereço e instruções de rota será apresentado na tela. Ainda, será possível o voluntário ter contato, por meio do aplicativo no celular, com o médico regulador do SAMU para orientações, em tempo real, das manobras de SBV. Se o voluntário responder “não” (não está disponível), será apresentada a seguinte mensagem: “Não se preocupe, o SAMU e outros voluntários estão a caminho da vítima. Obrigado pelo seu auxílio!".
Caso esse projeto piloto tenha seus resultados satisfatórios na execução do protocolo, poderá ser ampliado nacionalmente visando avaliar, de forma robusta, a efetividade da intervenção proposta em diferentes cenários e diferentes regiões do país.