A vida do mineiro Luiz Augusto Nogueira Borges, de 30 anos, mudou repentinamente ao ser diagnosticado com fibrose pulmonar, doença que faz com que os pulmões percam a capacidade de absorver e transferir oxigênio para a corrente sanguínea. O diagnóstico ocorreu em 2016, ao perceber que se cansava rapidamente durante atividades que já faziam parte do seu dia a dia. “O meu mundo desabou naquela época, porque tudo o que eu mais gostava de fazer, que era jogar bola, nadar, correr ou andar de bicicleta, me parecia impossível a partir daquele momento”, relata o policial penal.
Borges conta que seu quadro clínico piorou consideravelmente em setembro de 2019, após ficar três meses sem o medicamento que estabilizava sua condição pulmonar, o que o levou a precisar de um transplante. Ele, que já vinha sendo atendido na capital de São Paulo, foi encaminhado ao Hospital Israelita Albert Einstein, responsável por conduzir o Programa de Transplantes, que tem como um de seus propósitos viabilizar, gratuitamente, o atendimento a pacientes candidatos a transplante, desde a avaliação prévia até o acompanhamento após o procedimento – a iniciativa é realizada por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS (PROADI-SUS), em parceria com o Ministério da Saúde.
O rapaz entrou para a fila de transplantes em março de 2020, e passou pela cirurgia um ano depois. “Minha vida deslanchou depois daquele momento. É até difícil de acreditar, porque há seis meses eu estava preso a uma cama, respirando por oxigênio, sem perspectiva de nada. E hoje, até andar na rua parece algo extraordinário. Falo para todo mundo que o que eu vivi nesses seis meses pós-cirurgia não vivi nem antes do diagnóstico. Ainda não retomei minha rotina como antigamente, mas já corro um pouco e busco fazer de tudo, com os cuidados necessários por conta da pandemia”, afirma.
Luiz, que viveu a ansiedade da espera por um doador, deixa agora seu apelo à população: “o pulmão que recebi apareceu no momento certo, pois meu quadro já estava muito grave e sem possibilidade de reversão. Só eu, minha família e as pessoas que acompanharam a situação de perto entendem o valor desse momento para mim, e como isso salvou, literalmente, a minha vida. Por isso, eu digo: sejam doadores de órgãos! A vida de milhares de pessoas depende disso”.
Setembro Verde:
A história do policial penal faz parte dos 89.558 transplantes realizados no Brasil nos últimos dez anos e dos 3.195 do primeiro semestre de 2021 - dados do Registro Brasileiro de Transplantes da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Entretanto, dados do mesmo órgão mostram também um cenário preocupante: mesmo o Brasil sendo o segundo país do mundo em número de transplantes, cerca de 40% do total de potenciais doações não têm autorização da família, e outros 10% são perdidos por falhas no manejo clínico do paciente em morte cerebral. Agravando ainda mais o cenário, de acordo com dados do Ministério da Saúde, a pandemia de Covid-19 reduziu em 20% o número de transplantes em 2020.
Tendo em vista esse cenário, a Campanha Setembro Verde é realizada ao longo deste mês com o objetivo de sensibilizar a população para que mais pessoas se declarem doadores de órgãos e tecidos. A ideia é conscientizá-las sobre a importância de comunicar à família o desejo de doação, já que de acordo com o pneumologista Dr. José Eduardo Afonso Jr., “a falta de conhecimento sobre o desejo do parente em doar pode motivar os familiares a recusarem a ideia”.
Dr. José Eduardo destaca também os desafios enfrentados durante o período de pandemia. "Até 2019, a quantidade de doações vinha em curva ascendente, não só em números absolutos, mas também em relação a doador por população. Naquele ano, tínhamos 18 doadores por milhão de habitantes, e estimava-se que chegaríamos a 20. Porém, tivemos uma queda de 12,7%, voltando ao patamar equivalente a 2017, e não tendo doadores, o número de transplantes é impactado diretamente".
Houve uma variabilidade entre as regiões do Brasil: Sudeste e Centro-Oeste tiveram 5% de redução; Sul teve 13%; Nordeste, 28%; e Norte do país, 43%. Apesar da situação crítica, ao longo de 2020 o cenário foi sendo controlado, e "mesmo em épocas de maior disseminação da Covid-19, as entidades brasileiras de transplantes conseguiram se organizar para que a doação e as cirurgias ocorressem da forma mais segura possível. Contamos com instituições e profissionais extremamente engajados para que todo o processo fosse o mais eficiente possível", destaca o médico.
Segundo o Registro Brasileiro de Transplantes da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), foram realizados 3.195 procedimentos entre janeiro a junho de 2021, uma diferença de 13% em relação ao mesmo período de 2020, quando foram realizados 3.632 transplantes - em todo o ano, foram 14.499 procedimentos. “O Brasil é o país com o maior sistema público de transplantes do mundo e, apesar de toda a sua complexidade, conta com instituições e profissionais extremamente engajados para que todo o processo de doação de órgãos e transplantes seja o mais eficiente possível”, afirma.
Sobre o Programa de Transplantes do HIAE:
O Programa de Transplantes do HIAE capacita médicos para a realização de transplantes de tecidos e órgãos, bem como equipes multiprofissionais na aplicação das melhores práticas na assistência desde a admissão do paciente até o acompanhamento pós-transplante. O projeto também desenvolve cursos de capacitação médica no diagnóstico da morte encefálica, no intuito de reduzir a subnotificação desta condição e aumentar o número de potenciais doadores de órgãos.
Além do desenvolvimento das equipes do Sistema Único de Saúde (SUS), a iniciativa visa ao atendimento de pacientes mais complexos para a realização de transplantes de intestino, multivisceral e hipersensibilizados, à espera de transplante renal, assim como pacientes na fase pré ou pós-transplante que apresentam outras patologias, como o hepatopata, o cardiopata e o pneumopata.
Só este ano, garantiu o procedimento a 96 pacientes, sendo 52 transplantes de fígado; 1 multivisceral; 19 de rim; 13 de coração; e 11 de pulmão. No ano passado, foram 150 pessoas atendidas: 84 de fígado; 41 de rim; 14 de coração; e 11 de pulmão. Saiba mais no portal PROADI-SUS.